Sempre me sinto incomodada com o termo sala de estar. Este é aquele espaço da casa onde passamos pouco ou nenhum tempo e em que tudo que olhamos nos envia a mensagem: Proibido tocar. Como um santuário, a sala de estar costuma ter móveis caros, peças de vidro, um lugar que espanta crianças e cultuar o passado das cortes reais onde recebia-se o visitante com pompas e distanciamento.
A sala de estar é um lugar sem alma, um fake da vida. Esta, a vida, encontra calor e aconhego na cozinha, nas varandas, no quarto. Por isso fiz na minha casa a sala do fazer. Dos trabalhos manuais, dos deveres escolares repletos de cola, tesoura e lápis colorido, dos jornais mal dobrados e revistas marcadas para serem lidas mais tarde. Do sofá gasto das conversas com os amigos regadas a café e cerveja.
Uma vez fiz um almoço em minha casa para amigos de um antigo trabalho. Foi um dia de mão na massa preparando coletivamente um delicioso bobó de camarão que foi digerido com um bom vinho branco. Embora alguns estivessem visitando minha casa pela primeira vez, fizeram cesta após a refeição. E um destes amigos confessou-me mais tarde como foi mágico dormir sem reservas em uma casa que não era a dele. Naquele dia, todos se sentiram em casa.
Talvez, porque celebrávamos a vida, simplesmente. Naquele dia, tiramos o domingo para sermos felizes. Foi um dia de gato. Dia de Gato é dia de ficar curtindo o nosso lar, dia de cantar sem se importar de ser desafinado, dia de se sentir poderoso por aproveitar o tempo livre que se tem da melhor maneira possível. Aproveitar com quem se quer bem.
Ando preocupada com o relógio na parede da sala de estar. Nele, existem minutos para tudo. Escovar os dentes, arrumar a cama, hora de levantar, hora de dormir, hora de trabalhar, todos os dias da mesma maneira. Onde estão os ponteiros que marcam a hora da vida? Sinto que o compasso do tempo anda acelerado e há tanto que se fazer. Não que a rotina não seja uma parte da vida, mas onde colocar o tempo do improviso? Como conciliar o tempo livre de toda a família, os diferentes quereres e a deliciosa preguiça de simplesmente se jogar na rede? Para onde fugiu o meu Dia de Gato? Dia de lamber a cria, de acordar tarde e não arrumar a cama, de almoçar na rua ou desistir de sair?
Somos almas aceleradas em um grande planeta não tão mais azul, sentadas
em suas “salas de estar”, em estado constante de cumpridores de tarefas.
Onde está a sala dos pensamentos? Onde está a sala das novas
realizações? Vou procurar no telhado, atrás das cortinas, no alpendre da
janela. Em algum lugar vou encontrar, quero reencontrar o meu Dia de
Gato.
Nem sei que lhe hei-de dizer
ResponderExcluirSou tudo ao contrário do que acabei de ler
A sala de estar é para estar
Tudo o que lá está é para tocar
A prateleira alta
Tem tudo o que não faz falta
A do meio, à altura do olhar
é mesmo para a Alma recrear
A de baixo, a primeira,
é mesmo para a brincadeira
Tomamos as refeições
na sala de estar
E por aí ficamos
A comer, a beber, a conversar
Os quartos? os quartos são
para dormir
e procurar soluções para pequenas insónias
Umas frias, outras quentes
ardentes
ou, até mornas...
Não há relógios na parede
Para pensar
nada como uma boa janela
e poder olhar o Tejo, o mar
através dela
Neste espaço
Sem recato
Todos os dias são... Dias de Gato
Que bom saber, meu amigo, que por aí todos os dias são de gato. E estar, esta palavra portuguesa, pode ter outro sentido do outro lado do mar. Afinal, quem tem o Tejo para olhar, tem mesmo que por ali, à sala, quedar
ExcluirMalu minha querida
ResponderExcluirA minha sala de estar é usada diariamente, inclusive mais pelos gatos, do que por mim, eles que andam por cima de tudo, de vez em quando lá vai uma peça qualquer que eles partem. Eu não gosto de ter uma divisão na casa para museu, mas sim para nos gozarmos dela.
Bom fim de semana amiga.
Beijinho e uma flor
Perfeito Adélia! Casa não é museu. Beijos, amiga. E bom fim de semana também!
ResponderExcluir"Sinto que o compasso do tempo anda acelerado e há tanto que se fazer" e desejo também para mim esse dia de gato,
ResponderExcluirabraços
Que sejam muitos esses dias, amigo Ediney.
ExcluirMalu,
ResponderExcluirTenho 3 gatas e me afino com elas. Juntas as x fazemos nada e é tudo de bom.
Adorei teu texto celebrando a vida dentro da vida.
Muitos dias de gato pra ti em 2013.
Um abraço enorme de grande