Na esquina da rua havia um canteiro com flores.
O canteiro caiado de branco chamava minha atenção pelo contraste com as pétalas carmim, amarelas, roxas e azuis.
Sentada na janela de madeira na casa do outro lado da rua, buscava o colorido do dia naquele pedacinho de terra. De onde viriam? As cores.
Durante muitos anos da minha infância essa pergunta me perseguiu em sonhos e nas longas viagens do Rio de Janeiro à casa de minha avó materna no interior de Minas Gerais.
Tudo para mim naquela cidade – e naquela idade – tinha sabor e um colorido especial. Buscar leite na vizinha, o cheiro de pão quentinho que exalava na esquina da rua e que em um minuto tomava conta de toda vizinhança. Do brincar na rua até altas horas e só entrar porque não havia mais luz que permitisse novas travessuras.
Banho no gato, a contra gosto do bichano, é claro, cavar buraco no quintal só para encontrar as mãos do outro lado, roubar goiabas pelo simples gosto de fazer coisa errada, tocar campainha na casa dos outros, coisa danada de boa, sô!
Outro dia, saindo de uma aula de pintura com os dedos sujos de giz pastel, brinquei com meu filho e sua amiguinha de escola: Vindo para cá, para me encontrar com vocês, vi um arco-íris tão baixinho que consegui passar os dedos por ele e olhem como minha mão ficou repleta de cores. A menina de quatro anos arregalou os olhos e perguntou: Verdade? Meu filho, com seis, Foi certeiro: Mentira, mamãe!
Passado dois dias, nós dois no carro, ele me indaga: Mamãe, hoje você encontrou com aquele arco-íris?
Das férias de verão na casa de minha avó materna, guardo esta ingenuidade, este jogo de querer e não querer acreditar no improvável. Como dormir com a cabeça coberta por um cobertor e no dia seguinte acordar transformada em lobisomem. Os primos contaram e até hoje não consigo dormir com o rosto coberto.
Olhando para trás, fico muito feliz de ter tido infância. Olhando para frente, arregalo as vistas com muita curiosidade quando meu filho me diz:
- Mamãe, a fada do dente vai levar meu dentinho e deixar um presente debaixo do travesseiro. - Verdade? Mas às vezes ela deixa o presente e o dentinho, meu filho.
- Não, mamãe, ela leva mesmo.
No dia seguinte, a “fada” havia deixado um livrinho de histórias muito bem embrulhado e ele me diz:
- Mamãe ! A fada do dente pediu ajuda para o Papai Noel!
Passando por um caminho cheio de árvores para ir para sua escola, sempre brincamos que ali é uma floresta aonde habitam seres mágicos.
Há dias, no entanto, que ele me responde solene, com ares de adulto:
- Mamãe, Saci é lenda.
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"Absinto" é uma bebida destilada feito da erva Artemisia absinthium. Anis, funcho e por vezes outras ervas compõem a bebida. Ela foi criada e utilizada primeiramente como remédio pelo Dr. Pierre Ordinaire, médico francês que vivia em Couvet na Suíça por volta de 1792.É também conhecido popularmente de fada verde em virtude de um suposto efeito alucinógeno. Absinto, o blog, é um espaço para delírios pessoais e coletivos. Absinte-se e boa leitura.
heheheeheh Saudade do passado tb. Esta doce confusao entre realidade e lenda é o que ha de masi gostoso na infancia.
ResponderExcluirGostoso e saudoso...
Td mundo ja paertou campainha e saiu correndo, nao? rs
Ai, que saudade da ingenuidade da menina Mara que jogava o dente no telhado para a fada pegar e deixar um presente. Que brincava de feiticeira, fazendo porções mágicas para curar as pessoas boas e dar dor de barriga nas pessoas más e chatas. Adorei!!! Bjs. Mara
ResponderExcluirOlha que aqui saci não é lenda,aqui tem saci sim! Tentamos pegar um com uma peneira de cruzeta, mas ele fugiu. Tem que ser muito rápido para pegar saci. Eles são muito espertos.
ResponderExcluirBeijos
Oi Cida, minha prima querida. Sim, o pão era o da padaria do Jeová. Que saudades, não é? e acabei de me lembrar de você comigo na garupa andando de bicicleta pela cidade e o cheirinho do pão nos perseguindo. Ô delícia.
ResponderExcluirMenina, vou levar o Rafa aí para pegar Saci com vocês. Beijos.
ResponderExcluirSinto uma grande melancolia quando me lembro que minha mãe fazia questão de me informar que nada dessas coisas existia: Papai Noel, Coelho da Páscoa, seres míticos da floresta... Por conta disso, acho, hoje é um intenso exercício criar situações que ajudem Sophia a viver nessa fronteira entre mágico e real, tão cara à infância.
ResponderExcluirBeijo enorme!
AMeiiiiiiiiiiiii,amei tudo amiga Malu.........vi a Mari na situaçao da criança te perguntando sobre as cores do arco iris no seu dedo....rsrs..........adorei seu texto.....amei tb sobre a fala do Rafa sobre a fada do dente.......bju grande amiga........
ResponderExcluirEline
Quanta ternura em suas palavras... Pude visualizar cada cena e manter um leve sorriso no rosto enquanto lia sua prosa poética. Parabéns! Vc escreve muito bem! E seu blog é lindíssimo. Estou adorando as ilustrações...
ResponderExcluirBeijos!
Ai que delícia!!! Qta saudade também!!! Bjs
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