Ontem fui assistir a uma palestra
aqui na minha cidade com a escritora mineira Adélia Prado.
O que dizer. Passaria a noite
toda ouvindo aquela voz doce, ao mesmo tempo firme, falando sobre a vida.
Parecia que falava para mim. Parecia que falava para cada um em particular.
Adélia tem o dom da fala e da
escrita. Aquela magia que nos envolve e nos toca lá na alma.
Cada gesto, cada palavra, um fio
que se desenrola na experiência de quem já viveu e aprendeu.
Embora a sabedoria, saibamos,
chega com os anos, quando Adélia fala, parece que nasceu assim. Sábia.
E falou do amor. Do amor
feminino, do amor de homem e mulher, de mãe e filho. E falou do amor presente
no cotidiano da vida. Como em sua poesia, Adélia tem o dom de colorir os
detalhes. E todo o simples fica belo.
Não sabia que a autora era tão
religiosa. Católica, respeitosa de todas as crenças (até na crença dos ateus
que cultuam a não crença), falou de fé e de esperança e de tolerância com as
falhas de quem se ama. “Como seria bom casar com aquele pianista maravilhoso. A
mulher se casa e na vida dividida descobre que ele tem o péssimo hábito de
fazer bolhinhas com o miolo do pão". "Que vida chata a da rainha da Inglaterra,
tendo que se preparar todos os dias para inaugurar creches". "A vida tem sentido
nas coisas diárias, no descascar batatas, no lavar banheiros, no servir. Quando
temos um sentido na vida, tudo ganha significado”.
Como boa virginiana, sempre me
ative ao brilho dos detalhes, mas ando carente de outras crenças na humanidade.
Ora acredito, ora desejo sumir do planeta. Sentimentos comuns para uma vida
moderna em que não existe uma via única a escolher, mas uma multiplicidade de
escolhas que, por vezes, nos estagna.
Ando mais para a melancolia de Rachael
Jardim do que para a fé e a esperança de Adélia Prado. De qualquer maneira, sinto
que ontem renasci mais um pouco. Obrigada Adélia.
Deixo aqui um pouco de sua poesia
Solar
Minha mãe cozinhava exatamente
arroz, feijão-roxinho,
molho de batatinhas.
Mas cantava.
Minha mãe cozinhava exatamente
arroz, feijão-roxinho,
molho de batatinhas.
Mas cantava.
Ensinamento
“Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
“Coitado, até essa hora no serviço pesado”.
Arrumou pão e café , deixou tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.
“Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
“Coitado, até essa hora no serviço pesado”.
Arrumou pão e café , deixou tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.
Com licença poética
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado para mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
Já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado para mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
Já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
Puxa, imagino como deve ter sido legal! Ela é o máximo! beijos,chica e lindo dia!
ResponderExcluirSempre é bom ouvir a experiencia. Isto muito nos acrescenta.
ResponderExcluirBeijos.
Resumiu tudo lindamente !!!!!!!
ResponderExcluirEu vi a rápida entrevista no MGTV. Ela falou pra repórter que não gosta desse negócio de palestra não, mas que sabe que é importante o contato com o público, porque envolve o sentimento. Achei interessante essa colocação.
ResponderExcluirMalu claro que não conheço Adélia (tem o meu nome) mas por o que li, fiquei com o desejo de conhecer, ouvir tais palavras, pois parece ser realmente uma pessoa que transmite sentimentos muito fortes e até uma certa tranquilidade.
ResponderExcluirObrigada Malu pela partilha
beijinho e uma flor
Olá!!!, Deus te abençoe, amiga o seu blog é ótimo sucesso, já estou te seguindo, Aguardando Retribuição.
ResponderExcluirCanal Youtube: http://www.youtube.com/NekitaReis
Blog: http://arrasandonobatomvermelho.blogspot.com.br/
Gorgeous!
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