"Absinto" é uma bebida destilada feito da erva Artemisia absinthium. Anis, funcho e por vezes outras ervas compõem a bebida. Ela foi criada e utilizada primeiramente como remédio pelo Dr. Pierre Ordinaire, médico francês que vivia em Couvet na Suíça por volta de 1792.É também conhecido popularmente de fada verde em virtude de um suposto efeito alucinógeno. Absinto, o blog, é um espaço para delírios pessoais e coletivos. Absinte-se e boa leitura.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

O Aleph



Na parte inferior do degrau, à direita, vi uma pequena esfera furta-cor, e brilho quase intolerável (...) O diâmetro do Aleph seria de dois a três centímetros, mas o espaço cósmico ali estava, sem diminuição de tamanho.
Cada coisa era infinitas coisas, porque eu a via claramente de todos os pontos do universo. Vi o populoso mar, vi a aurora e a tarde, (...) vi uma prateada teia de aranha no centro de uma negra pirâmide, vi um roto labirinto (era Londres) ... vi, ao mesmo tempo, cada letra de cada página, (...) vi numa gaveta da escrivaninha cartas obscenas (...), vi teu rosto e senti vertigem e chorei (...)"

Neste conto de 1969, o escritor argentino Jorge Luís Borges talvez tenha sido um visionário do que viria a ser um dia a internet. Todas as coisas possíveis e imagináveis observadas de uma só vez em uma pequena esfera flutuante no porão de uma casa antiga. A possibilidade quase enlouquece o personagem.

Em outro conto, A Biblioteca de Areia, Borges novamente nos remete a imagem deste mundo infinito:

“Abri-o ao acaso. Os caracteres me eram estranhos. (...) Trazia uma pequena ilustração... Foi então que o desconhecido disse: - Olhe-a bem. Já não a verá nunca mais. (...) Pediu-me que procurasse a primeira folha. Apoiei a mão esquerda sobre a portada e abri com o dedo polegar quase pegado ao indicador. Tudo foi inútil: sempre se interpunham várias folhas entre a portada e a mão. Era como se brotassem do livro. - Agora procure o final. Também fracassei”.

A nós, este mundo aberto igualmente fascina e amedronta. O quanto podemos ficar cativos a ele? Consultar o Google é um péssimo exercício para a memória. Mas quem resiste a uma espiadinha? Desvelar o passado, perseguir a notícia em tempo real. Uma atmosfera tão inconsistente, por vezes intangível, por vezes pouco confiável, e completamente apaixonante que nos faz repensar a relação espaço/tempo em nossa contemporaneidade.

Em Orlando, Virgínia Wolf descreve o seu personagem, amante das artes e das letras, ao despertar após várias “reencarnações” em uma livraria no final do século XIX. Orlando desmaia ao perceber que não mais dará conta de toda a produção literária do planeta.

Seremos seres fragmentados para todo o sempre. Olhares de prismas, faces refratárias, mente em constante movimentação. E neste grande globo, pertencemos a muitas tribos e a nenhuma. Afinal, quem consegue compreender todas as possibilidades de seu Aleph interior?

Descrevo essas sensações e penso em como conviver com esta superficialidade humana. O autor equaciona a problemática de maneira poética. A mim, resta a persistência da dúvida.

“Na rua, nas escadarias de Constitución, no metrô, pareceram-me familiares todas as faces. Tive medo de que não restasse uma só coisa capaz de surpreender-me, tive medo de que jamais me abandonasse a impressão de voltar. Felizmente, depois de algumas noites de insônia, agiu outra vez sobre mim o esquecimento”.

6 comentários:

  1. A parte que mais me agrada é sobre o auto conhecimento...
    Será que um dia alguem vai realmente conseguir chegar nesse nivel de sabedoria?
    Eu espero que não seja eu huahuahua
    Beijos

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  2. Nossa, Malu, você arrasa!!
    Lindo post!
    Espero que ninguém consiga compreender todas as possibilidades de seu Aleph interior. A beleza da vida está nisso. As possibilidades mudam todos os dias enquando buscamos compreendê-las. É justamente por isso que elas mudam.. hehe

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  3. Malu,
    Sempre acreditei que escrever está na sua alma. Que bom que encontrou uma maneira da luz da sua alma resplander. Cada nova inserção é você está mais livre, mais bela.
    Seu blog está maravilhoso.
    Parabéns!
    Paulo

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  4. Oi Malu.
    Curti demais tudo o que você escreveu até agora. Mas esse post foi o que mais me agradou. Me lembrei na hora de um texto da Susan Sontag no qual ela diz:"A maneira moderna de ver é em fragmentos. Tem-se a sensação de que a realidade é essencialmente ilimitada e o conhecimento não tem fim...".
    Estarei à espera de atualizações!

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  5. Oi Malu

    Voce sabia que temos um grupo literário há 8 anos e que se chama Aleph por causa também deste conto do Borges? São as coincidencias, não?
    Seu Blog está dez!
    Um dia me encorajarei ter o meu.
    abraços
    fernando abrão

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  6. Olá Fernando,então eu preciso conhecer este grupo!

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