Ouvir uma boa música, tomar uma boa taça de vinho e, se você tiver a sorte de ter um pequeno canteiro de ervas, terá o privilégio de colher cada folha poucas horas antes do preparo do prato principal.
Páginas
"Absinto" é uma bebida destilada feito da erva Artemisia absinthium. Anis, funcho e por vezes outras ervas compõem a bebida. Ela foi criada e utilizada primeiramente como remédio pelo Dr. Pierre Ordinaire, médico francês que vivia em Couvet na Suíça por volta de 1792.É também conhecido popularmente de fada verde em virtude de um suposto efeito alucinógeno. Absinto, o blog, é um espaço para delírios pessoais e coletivos. Absinte-se e boa leitura.
sábado, 24 de abril de 2010
Uma pitada, apenas
E dos tempos imperiais herdamos o hábito de sentar-se à mesa e simplesmente quedar até o entardecer.
Até hoje, famílias de cidades pequenas mantêm o hábito de deixar a mesa posta do café da manhã para o almoço, do almoço para o lanche da tarde, em um sucessivo requinte gastronômico em que é preciso alimentar a prole como se fossem lobos esfomeados.
Recusar? Uma ofensa digna de confessionário. Dez Aves Marias e 30 Pai Nossos, no mínimo!
domingo, 18 de abril de 2010
Surrealidade passageira
No final da década de 70, recém chegado a Paris, onde até hoje reside, Juarez Machado se inscreveu em um concurso de novos talentos na pintura, conquistando o primeiro lugar daquela mostra. Os críticos de arte parisienses trataram logo de classificar sua pintura: “Surge um promissor pintor surrealista”, apontaram diante do quadro vencedor que retratava pessoas andando de bicicletas e guarda-chuvas.
Mal sabiam eles que esta cena tão improvável era lugar comum das lembranças de infância do pintor na cidade de Joinville, Santa Catarina, onde as pessoas iam trabalhar nas fábricas de bicicleta e, nos dias de chuva, lançavam mão do artefato.
Juarez Machado é por si só um personagem inusitado. Mas a cena, revelada no programa Conexão Roberto D´Ávila, fez voltar minha mente para o que é possível a cada um. Conheço pessoas estranhas – leiam isso como pessoas que fogem ao padrão estabelecido – e confesso ter facilidade para compreender e penetrar no mundo desses seres fora de rotulações. Afinal, a normalidade é um parâmetro que varia de cultura, humor e clima.
Tudo está bem quando você está bem e quando nossos atos não ferem ninguém. Comer abacate com açúcar é algo possível, a priori, apenas no Brasil. E que mal há? E que delícia descobrir a famosa iguaria mexicana – o guacamole. Sombrancelhas verdes estão na moda? Eu dispenso, mas para alguém elas devem fazer um sentido enorme e remeter, quem sabe, a infância em alguma uma tribo indígena?
Não julgarás para não ser julgado, este deveria ser o 11° mandamento. Antes, prefiro me deliciar com a diversidade do planeta. Conhecimento oxigena a alma. Talvez o propósito deste blog seja para que eu possa extravasar minhas pequenas observações sobre o mundo e também um exercício de manter meu cérebro como uma antena captadora de novos aprendizados.
Espero continuar me deslumbrando e absorvendo olhares diferenciados de um mesmo tema e, desta forma, manter acesa a chama de prazer pela vida. E se por acaso meu novo amigo usar um piercing esquisito, minha bagagem histórica não me permite achar que esta seja uma descoberta fantástica da humanidade, mas não me afastarei deste novo personagem que, tenho certeza, traz consigo outras e mais interessantes habilidades.
Afinal, estranho, são os outros.
sexta-feira, 9 de abril de 2010
Histórias não tão distantes de uma cidade distante – O Cigano
Há muitos anos um grupo de moças resolveu procurar um cigano que viajava pela região e que há tempos fazia parada em sua cidade. Na mão lida de uma das meninas, a revelação de que muitas viagens ainda seriam feitas. A moça, de origem humilde, fez ares de cética. E a turma, como era de se esperar, voltou para casa naquele dia sonhando com o futuro revelado pelo enigmático vidente.
Algum tempo depois, a moça recebeu um convite para morar em uma cidade maior. Era o início de que a profecia seria cumprida. Um dia, encontrou-se a jovem com uma mulher mais madura que lhe revelou um amor proibido. Ela havia se apaixonado por um cigano e sua família coibiu o namoro. Desde então, a mulher decidiu-se a não se casar.
A moça ouviu a história e perguntou: “Você sabe por onde ele anda?” “Nunca mais soube dele”. E a menina se calou. Não disse nada aquela mulher. Não disse que o cigano que morava agora em sua cidade era o mesmo cigano por quem ela era apaixonada. Não disse que ele vivia aparentemente só. Não disse uma palavra.
Terá sido sábia a menina por não querer intervir no destino dessas almas? Teria mudado alguma coisa na vida destes dois apaixonados se ela revelasse o seu segredo?
O certo é que a profecia se cumpriu. Minha mãe até hoje cumpre a sina desvelada pelo cigano de ser uma eterna viajante, descobridora de novos caminhos e novas histórias. Mantém a mesma discrição de não comentar o que escuta – sabedoria de quem viaja e conhece muito da vida. Cresci no meio dessas e outras memórias e, por vezes, me pego pensando como poderia ter sido mágico (ou não) o reencontros desses amantes.
Destruição
Os amantes se amam cruelmente
e com se amarem tanto não se vêem.
Um se beija no outro, refletido.
Dois amantes que são? Dois inimigos.
Amantes são meninos estragados
pelo mimo de amar: e não percebem
quanto se pulverizam no enlaçar-se,
e como o que era mundo volve a nada.
Nada. Ninguém. Amor, puro fantasma
que os passeia de leve, assim a cobra
se imprime na lembrança de seu trilho.
E eles quedam mordidos para sempre.
deixaram de existir, mas o existido
continua a doer eternamente.
Carlos Drumond de Andrade
Os amantes se amam cruelmente
e com se amarem tanto não se vêem.
Um se beija no outro, refletido.
Dois amantes que são? Dois inimigos.
Amantes são meninos estragados
pelo mimo de amar: e não percebem
quanto se pulverizam no enlaçar-se,
e como o que era mundo volve a nada.
Nada. Ninguém. Amor, puro fantasma
que os passeia de leve, assim a cobra
se imprime na lembrança de seu trilho.
E eles quedam mordidos para sempre.
deixaram de existir, mas o existido
continua a doer eternamente.
Carlos Drumond de Andrade
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