"Absinto" é uma bebida destilada feito da erva Artemisia absinthium. Anis, funcho e por vezes outras ervas compõem a bebida. Ela foi criada e utilizada primeiramente como remédio pelo Dr. Pierre Ordinaire, médico francês que vivia em Couvet na Suíça por volta de 1792.É também conhecido popularmente de fada verde em virtude de um suposto efeito alucinógeno. Absinto, o blog, é um espaço para delírios pessoais e coletivos. Absinte-se e boa leitura.

sábado, 24 de março de 2012

Gente grande, gente miúda

O legado maior que alguém pode dar a uma criança é a capacidade da imaginação. Chega a estação em que tudo dói dentro da gente. Dói o coração e os joelhos e dói profundamente suspirar pelo tempo que passou. Tenham sido bons ou maus tempos.

Tudo dói no pensamento.Penosas são as horas de insuportáveis desesperos, fadiga, impotência, um vazio sem muito um porque, uma sem vontade danada da vida.Nessas horas, o que alimenta a alma é o alicerce dos anos de alegria em que os dias e as noites passavam como relâmpagos que nem dava para brincar de tudo e os meses e anos eram longos, longos e sem fim.

Nos meus tempos de criança, vi figuras grandes que passavam e pareciam tão tristes. Hoje sou eu quem passo com meu rosto caído. Embora o outono se avizinhe revelando a chegada do inverno, ainda sinto o calor do sol e o brilho da esperança. Ainda consigo me alegrar com o canto dos pássaros.
Talvez porque algum dia, algum grande me ensinou a acreditar em coisas mágicas e simples. Bem simples.

"Não ensines a teu filho que as estrelas
Não são do tamanho que parece ter:
Maiores do que a terra!
São lâmpadas que os anjos acendem todos os dias
Assim que o sol começa a escurecer...
Não diga a teu filho
Que as asas dos anjos
Só existem na imaginação
Já vi meu anjo em sonho e posso jurar
Que ele tem asas claras
Que até parecem feitas de luz.
Não encha a cabeça do teu filho
Ensinando-lhe hipóteses precárias
Que amanhã de nada servirão.
Povoa de beleza
O olhar inocente do teu filho.
Dá-lhe uma provisão de bondade
Que chegue para a marcha da vida.
Infundi-lhe na alma o amor de Deus
E tudo mais por acréscimo ele terá.
"
Dom Helder Câmara

sexta-feira, 16 de março de 2012

A ansiedade e a arte do silêncio

Tenho aos poucos podido retomar o hábito da leitura. Depois que se é mãe de um menino cuja frase mais pronunciada quando você está por perto é: Manhéee, vem cá !!!!!!!!!, alguns textos parecem estar escritos em sânscrito para mim. Mas eis que os dias passam e a criança cresce e conseguimos administrar melhor o nosso tempo.

Neste instante começo a me deliciar novamente com o mundo literário e, como no filme a Rosa Púrpura do Cairo, absorvo o que leio e começo a levar o novo conhecimento para o meu dia-a-dia. Nesta gostosa divagação percebi um elo entre a minha leitura atual e a realidade que me cerca. Foi, então, que observei um mundo de ansiedade à minha volta. E um mundo extremamente feminino. Como, nós mulheres, somos ansiosas! 
Há sete dias me persegue a ansiedade alheia.  E, com apenas um sorriso de silêncio, apenas escuto, sem deixar nenhum rastro que possibilite perpetuar a agonia que paira nos corações de minhas confidentes. Há sete dias tenho exercitado esta difícil postura. E, é lógico, não sei por quanto tempo conseguirei manter esta atitude.
 
Seria a arte de ouvir para iniciados? Por que teimamos em dar nossa opinião sobre todos os fatos que chegam até nós sem ao menos esperar conhecer todos os ângulos de uma questão? E por quantas vezes percebemos que alguém está à nossa frente com olhar distante sem realmente escutar nada que desejamos compartilhar? Mais do que isso, necessitamos compartilhar, como se isso dependesse a continuidade dos batimentos do nosso coração?
 
Pois esta semana eu posso dizer que ouvi. Realmente ouvi pessoas que chegaram até mim com problemas diversos e eu realmente apenas escutei. Da minha boca não sairá palavra de julgamento ou de esperança, que incite à luta ou mesmo que console. 
As pessoas ansiosas não necessitam cultivar mais apreensão em suas vidas. Necessitam apenas e tão somente de um olhar atento que confirme que estão sendo escutadas. Que no silêncio da sua voz, possa o outro encontrar suas próprias respostas e seguir o seu caminho com menos atropelos, menor velocidade e mais felicidade. 

A mudança de curso não acontece em minutos ou mesmo dias, às vezes se leva uma vida toda. A serenidade é um hábito que pede um cultivo delicado. Nem muito sol, nem muita chuva, nem muita sombra. Só assim teremos uma árvore bela para apresentar ao longo da nossa caminhada.

domingo, 4 de março de 2012

40 graus à sombra


Foto - Malu Machado
O verão chegou aqui nas terras brasileiras tão intenso como o inverno europeu. Os termômetros marcam 40 graus em minha cidade, que não é famosa por verões intensos. A sensação térmica é bem maior. Sinto até dores no estômago de tanto calor, calor, calor. Minhas gatas renderam-se ao barulho ensurdecedor do ventilador e deitam-se em frente a ele. Que importa o medo deste bicho estranho? Querem se refrescar. 

Ontem a noite
o clima ficou um pouco mais ameno por aqui. O suficiente para as duas “meninas” caírem no mundo. Voltaram bem tarde, aproveitando a rara brisa do sábado. Felizes essas meninas. Eu e meu marido ficamos sentados na rede olhando as estrelas serem engolidas pela claridade da lua cheia que se aproxima.

Lua que meu filho tem como dever de casa observar e dizer à professora como ela está. Tarefa vivenciada com alegria, tão gostosa como saborear sorvete às oito da noite, coisa rara por aqui. (por que no Brasil temos o hábito de tomar sorvete só quando está quente?).

O verão de 2012 me lembra o verão em que meu filho nasceu. Um dia de nascido e lá estava ele só de fraldas. E suando por todos os poros após intensa mamada. Menino forte este meu filho, regado a leite materno com seus mistérios e sabedoria.

Lembra-me os verões cariocas da minha infância e da vida adulta. Dias e dias sem ânimo para nada. Sucos de laranja com limão, água de coco, chop gelado, tomar banho frio no meio da noite, chupar gelo com prazer de quem devora a melhor das iguarias.

Lembra-me os passeios em meio a matas, cachoeiras, a praias desertas. Mergulhos inesquecíveis de corpo e alma.

A pele dourada revela o vigor de energia renovada. O sol, astro rei, chegou! É tempo de celebrar toda a sua claridade. Não há como se esconder. Saiam às ruas, aproveitem a estação da luz. Em breve a Terra segue o seu curso e nossa estrela maior irá iluminar outros campos, outras mentes.

sexta-feira, 2 de março de 2012

Porão de ideias


De vez em quando é bom fazer faxina. Limpar a casa é um ótimo remédio para nos sentirmos de bem com a vida. Sabe aquela arrumada nas gavetas, jogar papéis fora, tirar aquele sujinho da tomada atrás da porta que ninguém vê, que sempre te incomoda, mas que você sempre deixa para depois? E aí vem aquele merecido banho, gostoso e relaxante, de quem está em harmonia com o universo.

Mas fazer faxina é cansativo, dá preguiça, é chato. Até que começamos e nos entregamos ao estado de espírito de limpeza profunda da alma. E é nesta entrega que os pensamentos vagam entre uma poeira e outra. Os pensamentos fluem. Chegam e vão, por vezes trazem correntes atormentadas, por vezes leves plainando no ar, por vezes com lágrimas, por vezes com euforia. Mas seja qual for a roupagem, eles chegam, eles vão, pois necessitam dar espaço ao ato de tirar o pó, lavar o chão, limpar e limpar, deixando tudo mais claro. E de alguma maneira este mecanismo de fazer e pensar nos estabiliza por um tempo.

Até que chega a hora em que temos que descer ao porão e enfrentar o que vivemos e o que deixamos de viver. Este é o meu tempo hoje. Necessito ávidamente de retirar toda poeira das minhas veias. Necessito de vida. E de repente me vejo em uma correria louca para realizar todos os projetos que um dia sonhei e deixei, com se não houvesse mais tempo.

Toda dor vale a pena. A minha, a sua. Não preciso de julgamentos nem de perdões. A minha dor é a dor da humanidade. Não há nada de errado comigo e, ao mesmo tempo, há tudo de errado. E simplesmente preciso percorrer este caminho, com sede, fome, cansaço, desânimo.

Que bom seria que tudo fosse fluido como um rio tranquilo. Como o dia em que fazer faxina nos dá prazer (nem sempre). E talvez seja esta a busca do equilíbrio. É preciso encarar a preguiça e o medo de mexer nas coisas lá dentro, mais profundas da minha alma.

Talvez eu volte a fechar a porta. Talvez eu jogue tudo para fora e comece a limpar. Talvez.