"Absinto" é uma bebida destilada feito da erva Artemisia absinthium. Anis, funcho e por vezes outras ervas compõem a bebida. Ela foi criada e utilizada primeiramente como remédio pelo Dr. Pierre Ordinaire, médico francês que vivia em Couvet na Suíça por volta de 1792.É também conhecido popularmente de fada verde em virtude de um suposto efeito alucinógeno. Absinto, o blog, é um espaço para delírios pessoais e coletivos. Absinte-se e boa leitura.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Caipirinha de Lima

Não sou muito de beber, mas há dias que a vida pede uma dose (ou duas). Apenas para relaxar e continuar seguindo. Tenho um amigo que voltou a fumar esta semana. É só um maço, me disse. Já está no segundo. Comprou logo que o primeiro acabou. Eu preciso, me disse.

Vou convidá-lo para uma caipirinha de lima. Temperada com adoçante. Não, não é por estética, é pelo gosto.

Vamos combinar que é uma hipocrisia dizer que café com adoçante é gostoso. Mas na caipirinha de lima não é que combina?



Outro dia li em uma revista que o Brasil é o país que mais consome Rivotril. 


A conclusão é que é pelo preço. Embora brasileiro não tenha hábito de ir ao psiquiatra, o medicamento cabe no orçamento e cumpre seu papel: por umas horas te transporta para outras esferas.

No livro Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley (que admiravelmente continua bem atual, embora escrito em 1953), a população foge de seus problemas usando o SOMA - um alucinógeno perfeito sem efeitos colaterais.

Ontem fiquei com a cabeça tão cheia que precisava fugir. Assim fiz. Há dois dias tomo um relaxante muscular porque o resfriado que me aflige não me permite o consumo de destilados, eles (os destilados) ressecam a alma.

O fato é que me rendi ao remédio farmacêutico e meus problemas saíram do meu corpo (ou será que fui eu é quem saí?)

Entendo o meu amigo do cigarro. As muletas, às vezes, são necessárias.

Cometer algumas loucuras é o que faz de nós pessoas ditas como sãs. É preciso extrapolar para continuar a viver. 


Um beijo roubado, uma dança audaciosa, soltar de pára-quedas, qualquer aventura é bem-vinda para preencher as lacunas entre um bom senso e outro.

Penso nos meus dragões de moinhos de vento.

Na fruteira, a lima me chama.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Cheiro de Chuva

Spring Rain por Udo Erasmus e Gary Bandzmer
Na noite anterior fiquei até tarde observando as formigas na pia da cozinha


Minha avó sempre dizia: sinal de chuva

O calor intenso merecia o presságio

Pensei nas lágrimas, também umedecem

Sorvi idéias e delírios

Noite de espera

Lembrei de quantos anos não me molhava na chuva

Então, saí para a rua e brindei a Primavera.

sábado, 11 de setembro de 2010

Saci é lenda !

Na esquina da rua havia um canteiro com flores.

O canteiro caiado de branco chamava minha atenção pelo contraste com as pétalas carmim, amarelas, roxas e azuis.

Sentada na janela de madeira na casa do outro lado da rua, buscava o colorido do dia naquele pedacinho de terra. De onde viriam? As cores.

Durante muitos anos da minha infância essa pergunta me perseguiu em sonhos e nas longas viagens do Rio de Janeiro à casa de minha avó materna no interior de Minas Gerais.


Tudo para mim naquela cidade – e naquela idade – tinha sabor e um colorido especial. Buscar leite na vizinha, o cheiro de pão quentinho que exalava na esquina da rua e que em um minuto tomava conta de toda vizinhança. Do brincar na rua até altas horas e só entrar porque não havia mais luz que permitisse novas travessuras.

Banho no gato, a contra gosto do bichano, é claro, cavar buraco no quintal só para encontrar as mãos do outro lado, roubar goiabas pelo simples gosto de fazer coisa errada, tocar campainha na casa dos outros, coisa danada de boa, sô!


Outro dia, saindo de uma aula de pintura com os dedos sujos de giz pastel, brinquei com meu filho e sua amiguinha de escola: Vindo para cá, para me encontrar com vocês, vi um arco-íris tão baixinho que consegui passar os dedos por ele e olhem como minha mão ficou repleta de cores. A menina de quatro anos arregalou os olhos e perguntou: Verdade? Meu filho, com seis, Foi certeiro: Mentira, mamãe!


Passado dois dias, nós dois no carro, ele me indaga: Mamãe, hoje você encontrou com aquele arco-íris?


Das férias de verão na casa de minha avó materna, guardo esta ingenuidade, este jogo de querer e não querer acreditar no improvável. Como dormir com a cabeça coberta por um cobertor e no dia seguinte acordar transformada em lobisomem. Os primos contaram e até hoje não consigo dormir com o rosto coberto. 


Olhando para trás, fico muito feliz de ter tido infância. Olhando para frente, arregalo as vistas com muita curiosidade quando meu filho me diz: 



- Mamãe, a fada do dente vai levar meu dentinho e deixar um presente debaixo do travesseiro. - Verdade? Mas às vezes ela deixa o presente e o dentinho, meu filho. 
- Não, mamãe, ela leva mesmo.

No dia seguinte, a “fada” havia deixado um livrinho de histórias muito bem embrulhado e ele me diz:



 - Mamãe ! A fada do dente pediu ajuda para o Papai Noel!

Passando por um caminho cheio de árvores para ir para sua escola, sempre brincamos que ali é uma floresta aonde habitam seres mágicos.

Há dias, no entanto, que ele me responde solene, com ares de adulto:

- Mamãe, Saci é lenda.

domingo, 5 de setembro de 2010

Vento de Pipa


pintura de juliane mercante

No meio de uma improvável tarde quente em um fim de inverno, 
vento norte revela os primeiros sinais da primavera.

Folhas secas invadem a varanda do quarto

Na cama, dois amantes entregues à própria sorte. 
Não mais uno. Dois corpos.

Distantes, quadro de um instante após o ato.
O calor, a boca seca. Sono intenso. Cheiro bom no ar.

Lá fora o vento chama
Cá dentro as almas descansam

Embora os uivos insistam em penetrar os ouvidos, simplesmente não há forças.

Uivo bom

Vento de pipa

Corpos salgados

Sorriso na boca

Olhos cerrados