"Absinto" é uma bebida destilada feito da erva Artemisia absinthium. Anis, funcho e por vezes outras ervas compõem a bebida. Ela foi criada e utilizada primeiramente como remédio pelo Dr. Pierre Ordinaire, médico francês que vivia em Couvet na Suíça por volta de 1792.É também conhecido popularmente de fada verde em virtude de um suposto efeito alucinógeno. Absinto, o blog, é um espaço para delírios pessoais e coletivos. Absinte-se e boa leitura.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Feijão Guandu - releitura





Dos sabores da minha infância, o mais forte que permanece na minha lembrança é o do feijão guandu. Todas as quartas, eu ia à feira com a minha mãe, no bairro da Tijuca, Rio de Janeiro. Feira na Visconde de Figueiredo, próxima à Alzira Brandão, famosa pelas comemorações nos jogos da copa do mundo.

Ainda me lembro do ir e vir dos carrinhos com rodinhas conduzidos pelas senhoras e meninos que ajudavam a carregar as compras por uns trocados. Minha mãe levava sacolas de pano ou de nylon colorido. E eu sonhava com o dia em que ela compraria um carrinho de feira, o que nunca aconteceu.

As paradas eram as mesmas: na barraca de peixe, as sardinhas vendidas às dúzias. Todas limpinhas, prontas para fritar ainda no almoço do dia; o caju de um vermelho intenso e aroma singular (minha mãe fazia o suco coado no pano de algodão); e o feijão guandu, medido no copo de vidro americano.

Não era raro ouvir o grito de alerta:“olha o rapa!”, anunciando aos ambulantes ilegais que a polícia se aproximava. Bastava chegar um pouco para o lado e dar passagem. Em tempos de fim de ditadura, eu, ainda sem entender o que se passava no país, secretamente desejava que os vendedores conseguissem fugir dos homens de farda.

Mais da feira não me lembro. Exceto por um homem cego que vendia bananadas e que por vezes minha mãe comprava para mim. Um dia, após longa ausência, encontramos com ele em uma rua da Tijuca. Paramos e ele disse: “- Como sua filha cresceu!” Daquele dia em diante, passei a desconfiar de que ele não era cego. E muito tempo se passou para eu compreender que temos cinco sentidos para reconhecer o outro.

A memória é seletiva. Trazemos à tona o que nos convém e damos aos fatos as cores que queremos, para o bem ou para o mal. Sorte que a maioria de nós tende a esquecer os eventos ruins e dar novo sentido as coisinhas antes sem graça do nosso cotidiano. E ainda delineamos um contorno especial às nossas aventuras juvenis, algumas até hoje inconfessáveis.

Como na música de Cesária Évora, hoje regressei no tempo, uma saudade com gosto de infância.





Mamãe velha venha ouvir comigo

O bater da chuva lá no seu portão

É um bater de amigo que

vibra dentro do meu coração



Venha Mamãe velha venha ouvir comigo
Recobre a força e chegue-se ao portão
A chuva amiga já falou, mantenha
e bate dentro do meu coração

A chuva amiga mamãe velha a chuva
Que há tanto tempo não batia assim
Ouvi dizer que a cidade velha a ilha toda
Em poucos dias já virou jardim

Dizem que o campo se cobriu de verde
Da cor mais bela porque é a cor da esperança
E a terra agora é mesmo cabo verde
É a tempestade que virou bonança


Venha comigo mamãe velha, venha
Recobre a força e chegue-se ao portão
A chuva amiga já falou, mantenha
e bate dentro do meu coração

A chuva amiga mamãe velha a chuva
Que há tanto tempo não batia assim
Ouvi dizer que a cidade velha a ilha toda
Em poucos dias já virou jardim

Dizem que o campo se cobriu de verde
Da cor mais bela porque é a cor da esperança
E a terra agora é mesmo cabo verde
É a tempestade que virou bonança

7 comentários:

  1. Incrível como as coisas que acontecem na nossa infância nos marcam de forma tão profunda que a gente leva por toda a vida. Por isso que acho que os pais devem ser cuidadosos com o que dizem para os filhos nessa fase, pode fazer toda a diferença na vida adulta da pessoa.

    Beijocas

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    1. Exatamente nisso que eu acredito, querida amiga. Eu, pelo menos, tenho mais vivas as memórias da minha infância do que da minha adolescência. Nelas eu vejo toda a minha alma. Todos os meus valores foram forjados na infância. Foi lá que eu os colhi, entraram em uma mala e seguem comigo viagem a fora.

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  2. Passei, vi, li e curti esse blog. Parabéns! Aguardo sua visita em meu blog: http://inkdesignerstampas.blogspot.com

    Gostei já estou seguindo...

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  3. Na foto só reconheci o feijão da primeira cesta que aqui em Portugal se chama feijão-frade. Os outros, mais coloridos, com um aspeto delicioso, não os conheço mas é provável que por cá também haja. Quanto à história que contou, adorei. O poema é lindo.

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  4. Excelente texto Malu, mexeu comigo!
    tenho marcas eormes da minha infância que jamais conseguirei apagar da minha memória, não tive adolescência, casei com 16 aninhos, sou uma mulher com um M, muito do que sou devo a meu pai, porque fui abandonada com 8 aninhos pela minha mãe, que presentemente está muito doente, e eu ando a sofrer demais, estou a perde-la (embora nunca a tivesse) a cada dia que passa, está aficar muito debilitada!
    Também tenho 3 netos a sofrerem imenso com o despreso que o pai lhes dá.
    Resto de bom fim de semana

    beijinho e uma flor

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  5. Gostei de ler este post. Amiga peço desculpa de não ter
    vindo com muita frequência visitar seu blogue, mas não
    o esqueci e venho especialmente desejar-lhe um ÓPTIMO 2013
    com tudo de bom.
    Espero/desejo que nos visitemos em 2013
    Um beijinho
    Irene Alves

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  6. Olá Malu espero que esteja tudo bem contigo.

    beijinho e uma flor

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